sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Opinião

Resistentes

A Excursão viera do Norte até Setúbal, e a reportagem (da SIC) vigiava. Nelas vinham crianças, mas percebeu-se que quase todos os excursionistas teriam mais de cinquenta anos e por isso já haviam ganho o triste direito de serem “velhos” num País onde a velhice está longe de suscitar generalizados respeito e atenções, bem pelo contrário. De facto, ser velho em Portugal é meio caminho andado para ser alvo indisfarçado desprezo, para receber humilhações várias e, é claro, para integrar o largo segmento de quase dois milhões de cidadãos que sobrevivem abaixo do limite que marca a fronteira da pobreza. E, contudo, os velhos resistem. A julgar pelo que a televisão deles nos mostra habitualmente, quase só resistem a jogar cartas em jardins públicos se forem homens e, se forem mulheres, a dançar se necessário umas com as outras em bailaricos simpáticos mas sempre um poucochinho ridículos. Na verdade, porém, os velhos fazem muito mais coisas, a televisão é que não se lembra delas, e não estou a pensar apenas nas muitas centenas de velhos que lêem, que estudam, que escrevem, que ensinam, que trabalham e o fazem muito bem: estou a pensar também nos que passeiam, isto é, nos que depois de muitos anos vividos num só lugar mitigam um pouco a antiga apetência de “ver mundo” e conseguem lugar numa excursão que lhes permitirá mirar, mesmo fugazmente, outras paisagens e outros lugares. È que, ao contrário do que por vezes presumem os novos, “as rugas não fazem peso”, como lembrou à reportagem uma das excursionistas. Não, pelo menos, o peso que impediria os velhos de serem gente a valer.


Correia da Fonseca

In: J. do Fundão de 20 de Agosto de 2009

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