quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

As pessoas querem Viver e não Sobreviver

                                                                      Anita Vilar


 


                 

O envelhecimento populacional é um triunfo. É o resultado do desenvolvimento das sociedades, uma vitória do ser humano sobre males adversos e também de políticas seguidas visando criar uma melhoria das condições de vida e de saúde das populações. Se, por
um lado é triunfo também é um problema, porque esse envelhecimento populacional é
, muitas vezes, visto como um problema por muitos dos governantes atuais. Para os idosos é um triunfo ou um problema se os anos ganhos a mais forem anos com qualidade de vida ou anos de sofrimento, de perdas, de incapacidades e de dependência.

Os idosos são objeto de um discurso ambíguo por par- te das instituições sociais e do Estado que ora os protege, ora os aponta como causadores dos males que afligem os sistemas públicos de saúde e de segurança social.

As pessoas desejam viver cada vez mais, desde que essa sobrevida aumentada lhes proporcione uma vida com boa qualidade.

Vida e Saúde o inseparáveis!

É intuitivamente óbvio que Vida e Saúde são inseparáveis. O que interessa à Saúde deve fazer parte de qualquer conceito de Qualidade de Vida. Isto, é funda- mental para os idosos. Ter Saúde é uma dimensão muito importante para a qualidade de vida dos idosos. Ter boa saúde é um fator determinante de boa qualidade de vida para os mais velhos.
A longevidade trouxe alterações nos padrões de saúde de todos os países, com aumento da cronicidade mudando, assim, o perfil de morbi-mortalidade. Nesta situação  de prevalência aumentada de dioenças crônicas, o principal objetivo dos procedimentos e políticas de saúde já não visa a cura, mas a manutenção de resultados dessas políticas e dos tratamentos que devem ser avaliados através de variáveis subjetivas, que incluam as perceções dos indivíduos em relação ao seu bem-estar.














































































































































































































A pobreza é um dos grandes fatores de risco para as pessoas idosas - as más condições económicas e de habitação, as reformas baixas, as dificuldades no acesso aos serviços e, em geral, o aumento das despesas em diversas áreas, particularmente na área da saúde, contribuem para as situações de vulnerabilidade e dependência destas pessoas.

Nas aldeias, a situação é, muitas vezes, mais dramática pelo isolamento social e geográfico, dificuldades de transporte e de acesso aos serviços.

Para podermos falar de uma boa qualidade de vida, tem de haver um nível material mínimo: a satisfação das necessidades mais elementares da vida humana. Alimentação, moradia, trabalho, educação, transporte, saúde, lazer, acesso a água potável, saneamento básico, respeito e dignidade são necessidades elementares. Para cada uma destas, há um nível minimamente aceitável. Abaixo dele, temos a exclusão social.

É verdade que, no nosso país, os idosos são, em geral, pessoas com possibilidades menores de uma vida com qualidade, devido não só à imagem social da velhice, vista como época de perdas, incapacidades, decrepitude, impotência, dependência, mas também, pela situação obletiva de reformas insuficientes, oportunidades negadas, enfim, de esclusão social. 

 
O acesso aos cuidados de Saúde está a tornar-se cada vez mais inacessível para os idosos devido aos aumentos das taxas moderadoras, das deslocações aos serviços, dos gastos com transportes e com medicamentos.

Os aumentos de preços de bens essenciais como água, gás, eletricidade e alimentação estão a degradar de forma acelerada a sua qualidade de vida, diminuindo a sua saúde e as suas resistências às doenças crónicas de
que padeçam
.

O ministro da Saúde já anunciou que vai haver cortes nas próteses, nos pacemakers, etc. facto que vai atingir, uma vez mais, os idosos, os idosos com deficiências e mesmo as deficiências próprias da idade.

A desumanidade cresce sem vergonha, mas todos os
idosos irão continuar a luta cada vez mais determinados e un
idos em torno do seu movimento que tem sabido sempre erguer a voz na defesa dos seus legítimos direitos.


Tirado do Jornal A Voz dos Reformados do MURPI

Por: Anita Vilar, Psiquiatra
 

 mano sobre males adversos e também de políticas seguidas visando criar uma melhoria das condições de vida e de saúde das populações. Se, por um lado é triunfo também é um problema, porque esse envelhecimento populacional é, muitas vezes, visto como um problema por muitos dos governantes atuais. Para os idosos é um triunfo ou um problema se os anos ganhos a mais forem anos com qualidade de vida ou anos de sofrimento, de perdas, de incapacidades e de dependência.

Os idosos são objeto de um discurso ambíguo por par- te das instituições sociais e do Estado que ora os protege, ora os aponta como causadores dos males que afligem os sistemas públicos de saúde e de segurança social.

As pessoas desejam viver cada vez mais, desde que essa sobrevida aumentada lhes proporcione uma vida com boa qualidade.

Vida e Saúde são inseparáveis!

É intuitivamente óbvio que Vida e Saúde são inseparáveis. O que interessa à Saúde deve fazer parte de qualquer conceito de Qualidade de Vida. Isto, é funda- mental para os idosos.
 Ter Saúde é uma dimensão muito importante para a qualidade de vida dos idosos. Ter boa saúde é um fator determinante de boa qualidade de vida para os mais velhos.
A longevidade trouxe alterações nos padrões de saúde de todos os países, com aumento da cronicidade mudando, assim, o perfil de morbi-mortalidade. Nesta situação de prevalência aumentada de doenças crônicas, o principal objetivo dos procedimentos e políticas de saúde já não visa a cura, mas a manutenção de uma boa qualidade de vida. Nos dias de hoje, os resultados dessas políticas e dos tratamentos devem ser
avaliados através de variáveis subjetivas, que incluam as perceções dos indivíduos em relação a seu bem-estar.


A pobreza é um dos grandes fatores de risco para as pessoas idosas - as más condições económicas e de habitação, as reformas baixas, as dificuldades no acesso aos serviços e, em geral, o aumento das despesas em diversas áreas, particularmente na área da saúde, contribuem para as situações de vulnerabilidade e dependência destas pessoas.

Nas aldeias, a situação é, muitas vezes, mais dramática pelo isolamento social e geográfico, dificuldades de transporte e de acesso aos serviços.

Para podermos falar de uma boa qualidade de vida, tem de haver um nível material mínimo: a satisfação das necessidades mais elementares da vida humana. Alimentação, moradia, trabalho, educação, transporte, saúde, lazer, acesso a água potável, saneamento básico, respeito e dignidade são necessidades elementares. Para cada uma destas, há um nível minimamente aceitável. Abaixo dele, temos a exclusão social.

É verdade que, no nosso país, os idosos são, em geral, pessoas com possibilidades menores de uma vida com qualidade, devido não só à imagem social da velhice, vista como época deperdas, incapacidades, decrepitude, impotência, dependência, mas, também,pela situação objetiva de reformas insuficientes, oportunidades negadas, enfim, de exclusão social.
O acesso aos cuidados de Saúde está a tornar-se cada vez mais ina cessível para os idosos devido aos aumentos das taxas moderadoras, das deslocações aos serviços, dos gastos com transportes e com medicamentos.
Os aumentos de preços de bens essenciais como água, gás, eletricidade e alimentação estão a degradar de forma acelerada a sua qualidade de vida, diminuindo a sua saúde e as suas resistências às doenças crónicas de que padeçam.

O ministro da Saúde



















domingo, 20 de janeiro de 2013

Para onde vão os nossos idosos? Acolhimento, sim; exclusão, não!

Vivemos tempos difíceis, marcado por uma cada vez maior individualidade, onde vive-se “cada um por si e Deus por todos”! É preocupante perceber que, por causa da dinâmica actual da vida contemporânea, nossos idosos acabam por viver excluídos das suas próprias famílias, restando-lhes tão-somente a pouco desejada solidão, seja em suas próprias casas ou nas instituições geriátricas. A convivência intergeracional, tão importante a todas as faixas etárias (do nascimento à velhice), acaba por ser desprezada e transforma-se em uma verdadeira utopia nos dias hodiernos. Lamentável, pois inúmeros benefícios perdem-se, empobrecendo a vida familiar, comunitária e em sociedade de uma forma geral. A troca de ideias, conhecimentos, experiências e vivências é fundamental para um crescimento e enriquecimento sócio-cultural dos seres humanos. Quanto mais individualizada a nossa existência, menos proveito tiramos das vicissitudes das tão importantes e enriquecedoras relações interpessoais. O ser humano, ser gregário por excelência, carece dos contactos, das relações e dos afectos, para uma existência plena e satisfatória. Entretanto, aos poucos tem se distanciado da proximidade interpessoal, seja pela máquina, pelo excesso de tarefas e compromissos, pelas grandes distâncias entre o local de trabalho e a residência, pela diminuição espacial dos imóveis residenciais, pelos conflitos conjugais e/ou familiares e pela cada vez menor tolerância das pessoas umas para com as outras. Triste cenário! Nas últimas décadas, temos excluído nossos idosos de vários espaços: do mercado de trabalho, da convivência familiar e da maior parte dos grupos sociais. Restam-lhes algumas poucas opções: o habitual café, algumas praças públicas, um reduzido número de universidades seniores, algumas esporádicas oportunidades de trabalhos voluntários em instituições de saúde, filantrópicas e/ou de solidariedade social Que possamos acolher melhor os nossos idosos em família, no mercado de trabalho e em todos os espaços que lhe sejam significativos! Afinal, tudo aquilo que temos hoje, inclusive os mais diferentes espaços sociais, culturais e comunitários, também foi construído pelos jovens de outrora – os idosos de hoje! Por:Arthur Moreira da Silva Neto

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

GREVE GERAL E VIOLÊNCIA DO GOVERNO

  Em Setembro, na manifestação do dia 15, parecia o céu aberto, com a saída espontânea de tanta gente que se juntou na Praça de Espanha, em Lisboa. Eram a indignação e o protesto. Foi também o "elogio" da liberdade inorgânica, indo-se ao extremo de alguns indigentes que por ali andavam dizerem mal de sindicatos e partidos... Pois, sim. Mas no final desse mês, no dia 29, a Praça do Comércio e muitas ruas de Lisboa encheram-se de gente organizada e com consciência interventiva que afirma nos locais de trabalho, nas zonas de residência, no desemprego e ao lado de milhares de trabalhadores que todos os dias vão e vêm de casa ou do quarto alugado para o trabalho. Trabalhadores que prestam atenção sofrida e revoltada ao que se passa e que lutam contra a destruição de direitos, da economia e da independência do País, levada a cabo por este Governo nefasto do PSD/CDS-PP. Não esquecem o papel principal do PS nos governos anteriores. Guterres e José nSócrates, antes e depois de Durão Barroso e Santana Lopes, foram primeiros- ministros da obediência cega aos patrões de neoliberais de pacotilha como são agora Passos Coelho, Gaspar e Miguel Relvas, entre outros "governantes" de opereta e de miséria ética e moral instalada. Perante o que aconteceu em 29 de Setembro e no crescendo de lutas, face a essa manifestação magnífica da função pública e à concentração em São Bento, no dia 31 de Outubro, o Governo, o Ministério da Administração Interna e os operadores das secretas e do silêncio repressor organizaram-se e construíram a oportunidade para darem um golpe superior, na vigilância e na actuação concertada que levam a cabo. No dia 31 de Outubro, até às 24 horas, as televisões não deram imagens da manifestação da função pública e da concentração em São Bento, no dia da votação inicial do Orçamento do Estado. Deram a violência dos petardos, de tentativas de enfrentamento de provocadores encartados contra a polícia. Essa foi a "experiência" já transmitida exaustivamente em directo pelas televisões, desde o cair da noite, como se tudo o mais não tivesse existido, a manifestação enorme, a intervenção de Arménio Carlos, a decisiva demonstração de força organizada que foi a concentração dessa tarde. Na preparação da greve geral de 14 de Novembro, a repressão nas empresas e a presença policial face aos piquetes de greve, comandada a altos níveis, já foi violenta e desmascarava o que aí viria. No dia 14, a manifestação foi extraordinária, com milhares de trabalhadores que vieram de todos os lados, sem transportes públicos, mas vieram para expressar, do Rossio a São Bento, a revolta e a força organizada que nos caracteriza. As televisões, nesse dia e no dia seguinte, pouco ou nada disseram da greve geral enorme, dos piquetes de greve, da força e do prestígio da CGTP, da postura da UGT, que viu ir à greve perto de trinta sindicatos que ainda tutela mas têm trabalhadores que não cedem como desejaria. Às cinco horas da tarde, a manifestação e as intervenções tinham acabado. Quem percebe de movimentações orquestradas em situações assim viu deslizarem os que tinham orientações para ocuparem a frente de provocação perante os polícias dispostos na escadaria e adjacências do Palácio de São Bento. Esses trabalhadores conscientes e organizados viram isso e tentaram influenciar aqueles que queriam ficar a assistir, na indignação e na raiva que, às vezes, até podem dar moldura humana ao que é perigoso e extremamente negativo para o trabalho e as lutas que hão-de vir. Parecia que "o patamar superior da revolução" era atirar pedras aos polícias... Que todos aproveitem o que foi visível e o que era invisível e hipócrita por parte do Governo e dos altos comandos da polícia e das secretas. Quase duas horas de pedradas, de petardos, de poucos provocadores e provocadoras que serviram para prejudicar e ocultar a força imensa da greve geral, o acontecimento maior desse dia. Havia polícias à paisana desesperados por não terem ordem para impedir os profissionais de arrancar e atirar pedras da calçada. Um a um, teriam sido identificados e a coisa acabaria ali. Mas isso não servia o passo superior da repressão que o Governo e o ministro da Administração Interna tinham ordens para praticar nesse dia. Quando a situação estava madura, um megafone deu um aviso mal ouvido, de cinco (!) minutos para todos se retirarem... Os experientes provocadores desapareceram quando a polícia entrou no largo e bateu sobretudo em gente que estava ali porque a raiva mal orientada e expectante não os deixava ir para casa. Houve feridos, prisões também em outras zonas da cidade, houve o espectáculo da arrancada da polícia pelo largo e ruas afins, repetido até à exaustão para isso mesmo, nas televisões, para meter medo e avisar que tudo passou a ser diferente, e caiu a máscara de Miguel Macedo e de comentadores e orientadores televisivos de serviço ao corte e à censura. Acabou a "boa vontade em democracia" do Governo e, sobretudo, a desatenção de quem tem de estar atento e consciente. Em qualquer situação, seja onde for, na empresa, na manifestação, na concentração e em todas as lutas, os trabalhadores e as trabalhadoras, os desempregados e as populações revoltadas são dignos de se revoltarem e têm todo o direito de o fazerem. Mas os provocadores "espontâneos" ou pagos serão para isolar determinadamente e para remeter aos diversos papéis que têm contratualizado com os patrões e o Governo, com os serviços secretos e seja quem for que lhes paga para prejudicarem lutas, greves locais e greves gerais e outras batalhas que hão-de crescer e virão a ser realizadas. Cá estarão os trabalhadores, os desempregados, os jovens e as mulheres, as populações revoltadas e lutadoras, os que estão organizados em sindicatos e forças políticas e sociais revolucionárias, para levarem a cabo as lutas necessárias e desmascararem os objectivos e a hipocrisia dos governantes, para isolarem os seus apaniguados de serviço nas ruas e na provocação profissionalizada que se tornou muito mais evidente e perigosa no dia da greve geral.
 
Modesto Navarro

domingo, 6 de janeiro de 2013

Reformado/Idoso:Ir para o Hospital é um (grande )risco.


O Texto abaixo transcrito, dá para meditar, não se pense que é uma "brincadeira" do autor.
O sonho de Pedro Passos Coelho

«"Um terço é para morrer. Não é que tenhamos gosto em matá-los, mas a verdade é que não há alternativa. se não damos cabo deles, acabam por nos arrastar com eles para o fundo. E de facto não os vamos matar-matar, aquilo que se chama matar, como faziam os nazis. Se quiséssemos matá-los mesmo era por aí um clamor que Deus me livre. Há gente muito piegas, que não percebe que as decisões duras são para tomar, custe o que custar e que, se nos livrarmos de um terço, os outros vão ficar melhor. É por isso que nós não os vamos matar. Eles é que vão morrendo. Basta que a mortalidade aumente um bocadinho mais que nos outros grupos. E as estatísticas já mostram isso. O Mota Soares está a fazer bem o seu trabalho. Sempre com aquela cara de anjo, sem nunca se desmanchar. Não são os tipos da saúde pública que costumam dizer que a pobreza é a coisa que mais mal faz à saúde? Eles lá sabem. Por isso, joga tudo a nosso favor. A tendência já mostra isso e o que é importante é a tendência. Como eles adoecem mais, é só ir dificultando cada vez mais o acesso aos tratamentos. A natureza faz o resto. O Paulo Macedo também faz o que pode. Não é genocídio, é estatística. Um dia lá chegaremos, o que é importante é que estamos no caminho certo. Não há dinheiro para tratar toda a gente e é preciso fazer escolhas. E as escolhas implicam sempre sacrifícios. Só podemos salvar alguns e devemos salvar aqueles que são mais úteis à sociedade, os que geram riqueza. Não pode haver uns tipos que só têm direitos e não contribuem com nada, que não têm deveres.
Estas tretas da democracia e da educação e da saúde para todos foram inventadas quando a sociedade precisava de milhões e milhões de pobres para espalhar estrume e coisas assim. Agora já não precisamos e há cretinos que ainda não perceberam que, para nós vivermos bem, é preciso podar estes sub-humanos.
Que há um terço que tem de ir à vida não tem dúvida nenhuma. Tem é de ser o terço certo, os que gastam os nossos recursos todos e que não contribuem. Tem de haver equidade. Se gastam e não contribuem, tenho muita pena... os recursos são escassos. Ainda no outro dia os jornais diziam que estamos com um milhão de analfabetos. O que é que os analfabetos podem contribuir para a sociedade do conhecimento? Só vão engrossar a massa dos parasitas, a viver à conta. Portanto, são: os analfabetos, os desempregados de longa duração, os doentes crónicos, os pensionistas pobres (não vamos meter os velhos todos porque nós não somos animais e temos os nossos pais e os nossos avós), os sem-abrigo, os pedintes e os ciganos, claro. E os deficientes. Não são todos. Mas se não tiverem uma família que possa suportar o custo da assistência não se pode atirar esse fardo para cima da sociedade. Não era justo. E temos de promover a justiça social.
O outro terço temos de os pôr com dono. É chato ainda precisarmos de alguns operários e assim, mas esta pouca-vergonha de pensarem que mandam no país só porque votam tem de acabar. Para começar, o país não é competitivo com as pessoas a viverem todas decentemente. Não digo voltar à escravatura - é outro papão de que não se pode falar -, mas a verdade é que as sociedades evoluíram muito graças à escravatura. Libertam-se recursos para fazer investimentos e inovação para garantir o progresso e permite-se o ócio das classes abastadas, que também precisam. A chatice de não podermos eliminar os operários como aos sub-humanos é que precisamos destes gajos para fazerem algumas coisas chatas e, para mais (por enquanto), votam - ainda que a maioria deles ou não vote ou vote em nós. O que é preciso é acabar com esses direitos garantidos que fazem com que eles trabalhem o mínimo e vivam à sombra da bananeira. Eles têm de ser aquilo que os comunistas dizem que eles são: proletários. Acabar com os direitos laborais, a estabilidade do emprego, reduzir-lhes o nível de vida de maneira que percebam quem manda. Estes têm de andar sempre borrados de medo: medo de ficar sem trabalho e passar a ser sub-humanos, de morrer de fome no meio da rua. E enchê-los de futebol e telenovelas e reality shows para os anestesiar e para pensarem que os filhos deles vão ser estrelas de hip-hop e assim.
O outro terço são profissionais e técnicos, que produzem serviços essenciais, médicos e engenheiros, mas estes estão no papo. Já os convencemos de que combater a desigualdade não é sust entável (tenho de mandar uma caixa de charutos ao Lobo Xavier), que para eles poderem viver com conforto não há outra alternativa que não seja liquidar os ciganos e os desempregados e acabar com o RSI e que para pagar a saúde deles não podemos pagar a saúde dos pobres.
Com um terço da população exterminada, um terço anestesiado e um terço comprado, o país pode voltar a ser estável e viável. A verdade é que a pegada ecológica da sociedade actual não é sustentável. E se não fosse assim não poderíamos garantir o nível de luxo crescente da classe dirigente, onde eu espero estar um dia. Não vou ficar em Massamá a vida toda. O Ângelo diz que, se continuarmos a portarmo-nos bem, um dia nós também vamos poder pertencer à elite."»

José Vítor Malheiros

(no Público de 05 de Jan.2013)

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O Roubo aos Reformados



440.000 PENSIONISTAS VÃO PAGAR IRS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA DE

SOLIDARIEDADE, OU SEJA, DE UM RENDIMENTO QUE NÃO RECEBEM: - eis o presente de “Ano Novo” deste governo para os pensionistas

 

Os aposentados da CGA e os reformados da Segurança Social são objeto, mais uma vez, de

tratamento desigual por parte deste governo. Passos Coelho e Vítor Gaspar, a pretexto de que a

“CES (Contribuição Extraordinária de Solidariedade) visa atingir um efeito equivalente à medida de redução salarial que tem vindo a ser aplicada aos trabalhadores do setor público desde 2011, a rendimento superiores a 1.500€” como consta da “Nota Técnica sobre a Contribuição Extraordinária de Solidariedade”, elaborada pelo Ministério das Finanças, em que se procura enganar e manipular a opinião publica já que omite os efeitos do confisco do subsidio de ferias e

do corte nas remunerações da Função Pública; repetindo, a pretexto de igualizar a situação entre

dos pensionistas com a dos trabalhadores da Administração Pública, criam mais um imposto a pagar pelos pensionistas (o ódio destes “senhores” a quem trabalhou e descontou toda a vida não

tem limites). No entanto, ou por ignorância ou com a intenção deliberada de manipular a opinião

pública omitem, por um lado, que este novo corte nas pensões vai ser realizado sobre valores para os quais os pensionistas descontaram toda a vida, violando o contrato social que existia e

portanto não se comportando como pessoas de bem (este governo não tem o mesmo comportamento em relação aos contratos leoninos que o Estado assinou com grandes grupos

económicos relativos a PPP) e, por outro lado, que contrariamente ao que sucedeu com os trabalhadores da Função Pública, a maioria dos aposentados e reformados ainda terá de pagar IRS sobre a totalidade ou sobre uma parcela da Contribuição Extraordinária de Solidariedade que

vão suportar pois não têm a possibilidade de a deduzir no rendimento sujeito a IRS.

440.000 PENSIONISTAS DA CGA E DA SEGURANÇA SOCIAL TERÃO DE PAGAR IRS SOBRE O C.E.S.

Contrariamente ao corte violento entre 3,5% e 16% feito nas remunerações dos trabalhadores da

Função Pública, em que o IRS e a contribuição para CGA e ADSE só são calculados sobre o valor da remuneração após ter sido feito aquele corte, em relação à chamada Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) constante da Lei OE-2013, elaborada por este governo e

aprovada na Assembleia da República apenas pelo PSD e CDS, o mesmo não se vai verificar. A

C.E.S. que será aplicada, em 2013, às pensões de valor igual ou superior a 1.350€, e cujas taxas

variam, segundo o artº 78º da lei, entre 3,5% e 40% (esta última taxa para a parcela da pensão

mensal superior a 18 IAS, ou seja, a 7.543€ por mês) não é deduzida antes de se calcular o IRS;

repetindo, contrariamente ao que se verificou no corte das remunerações, o IRS e a contribuição

dos aposentados para a ADSE incidem sobre sobre o valor da pensão sem a dedução da Contribuição Extraordinária da Solidariedade, portanto, a maioria dos pensionistas vai pagar IRS e contribuição para a ADSE sobre o CES, ou seja, sobre um valor que não recebem, Expliquemos

por que razão e como isso acontece.

Segundo a “Nota Técnica sobre a Contribuição Extraordinária de Solidariedade” elaborada pelo

Ministério das Finanças, a CES cai no âmbito do artº 53º do Código do IRS, o que significa que ela é deduzida ao rendimento sujeito a IRS apenas na parte que exceder a dedução especifica que já têm atualmente os rendimentos de pensões, ou seja, 4.104 €, que é a parcela do rendimento do pensionista que atualmente já não paga IRS; portanto, enquanto o valor da Contribuição Extraordinária de Solidariedade anual não for superior a 4.104€, o aposentado da CGA e o reformado da Segurança Social não podem deduzir mais nada para além do que já deduziam em 2012, suportando, por essa razão, integralmente a CES pois não a podem deduzir no rendimento sujeito a IRS. Isto vai acontecer aos pensionistas com pensões entre os 1.350€ e 1.717€, que são cerca de 150.000 pensionistas da CGA e da Segurança Social. Estes pensionistas de pensões mais baixas vão sofrer, em 2013, um corte nos seus rendimentos, só devido à CES, que estimamos em 100 milhões € não podendo deduzir qualquer importância mais no rendimento sujeito a IRS para além do que conseguiram deduzir em 2012, ano em que ainda não existia CES.

E o que acontecerá em relação aos pensionistas com pensões superiores a 1.717€ por mês? – É

a pergunta que imediatamente se coloca. Segundo o nº5 do artº 53º do Código do IRS, contrariamente ao que sucede com os trabalhadores do ativo (eis mais um exemplo de tratamento desigual de contribuintes com o mesmo rendimento), a dedução especifica que tem os

pensionistas referida anteriormente – 4.104€ - é reduzida num valor corresponde a 20% da parcela da pensão anual que exceda 22.500€, o que determina que, para uma pensão anual de

43.200€ (3.085€ por mês), a dedução especifica seja ZERO, ou seja não deduz nada, o que não

acontece com os rendimentos do trabalho que continuam a deduzir a dedução especifica de 4.104€ na totalidade. Isto significa que os pensionistas com pensões entre os 1.717€ e os 3.085€,

terão de suportar uma parcela da Contribuição Extraordinária de Solidariedade, que corresponde à parcela da dedução especifica que resta depois da dedução dos 20% referidos anteriormente. E

os pensionistas nesta situação, em que uma parcela da CES é absorvida pela parte da dedução

especifica que resta depois de deduzir os 20% referidos anteriormente, rondarão os 290.000 em

2013. Estimamos que estes pensionistas sofram uma redução nos rendimentos de cerca de 300

milhões €. Apenas os pensionistas da CGA e da Segurança Social, com pensões mensais superiores a 43.200 € por ano, cuja dedução especifica por rendimentos de pensões é já ZERO, é

que poderão deduzir no seu rendimento sujeito a IRS a totalidade da Contribuição Extraordinária

de Solidariedade. Os pensionistas da CGA e da Segurança Social com pensões anuais superiores a 43.200€ são cerca de apenas 30.000, que deverão pagar uma Contribuição Extraordinária de Solidariedade que estimamos em 50 milhões € em 2013. São apenas estes que conseguirão deduzir a totalidade da CES no seu rendimento sujeito a IRS, e por isso serão os únicos que não pagarão IRS sobre a CES. Mais uma vez fica clara a politica de classe de austeridade deste governo, atingindo mais fortemente aqueles que têm rendimentos mais baixos, e poupando os grupos de rendimentos mais elevados.

Contrariamente ao que fez o Ministério das Finanças na “Nota Técnica sobre a Contribuição

Extraordinária de Solidariedade”,em que omitiu o efeito na redução do rendimento disponível de

pensionistas e dos trabalhadores resultante do confisco do subsidio de férias aos pensionistas

(90%) e à Função Pública, assim como do corte das remunerações à Função Pública para ocultar

os seus efeitos.

 Como consequência do confisco do subsídio de férias aos pensionistas (90%) e aos trabalhadores da Função Pública, e do corte de remunerações a estes últimos, da Contribuição Extraordinária de Solidariedade sobre os pensionistas, da nova Tabela de IRS e da sobretaxa de IRS aprovada pelo governo e pelo PSD e CDS na Assembleia da República verificar-se-á, em 2013, uma redução significativa no rendimento liquido disponível dos pensionistas, dos trabalhadores Função Pública e dos trabalhadores do setor privado. No entanto, essa redução é maior nos pensionistas, seguindo-se a dos trabalhadores da Função Pública, e depois a dos trabalhadores do setor privado. Assim, até ao escalão de rendimento anual de 16.800€ (1200€ /mês), as maiores reduções percentuais de rendimento verificam-se nos rendimentos dos trabalhadores da Função Pública, mas a partir deste escalão de rendimento os maiores cortes de rendimento passam a ser nos rendimentos dos pensionistas. Assim, verifica-se uma redução de 27,4% numa pensão anual ilíquida de 22.400€/ano (1.600€/mês), enquanto nos trabalhadores privados, com o mesmo rendimento ilíquido, a redução é de 19,7% e no setor público de 26,8%;  uma redução de 29% numa pensão de 25.200€/ano (1.800€/mês), enquanto um trabalhador do setor privado, com o mesmo rendimento, sofre uma redução de 21,5%, e um da Função Pública de 28,2%; (3) Um pensionista sofre um corte de 32,7% se tiver uma pensão anual ilíquida de 28.000€/ano (2.000€/mês), enquanto um trabalhador do setor privado, com o mesmo rendimento iliquido, sofre uma redução 23,4%, e um da Função de 29,6%; (4) Para um rendimento anual ilíquido de 35.000€ (2500€/mês), um pensionista sofre um corte de 39,3%, um trabalhador do setor privado de 26,8%, e um da Função Pública de 34,4%; (5) Para o rendimento ilíquido de 42.000€/ano (3000€/mês), a redução é de 41,6% para o pensionista, de 28,6% para o trabalhador do setor privado, e 37,6% para o trabalhador da Função Pública; etc., etc.. Os dados mostram a violência dos cortes e das desigualdades que a politica de classe deste governo está provocar mas que procura ocultar.

Eugénio Rosa, edr2@netcabo.pt , 26.12.2012

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

A culpa é do polvo

Fio-de-prumo
Paulo Morais

A ideia de que os portugueses são responsáveis pela crise, porque andaram a viver acima das suas possibilidades, é um enorme embuste. Esta mentira só é ultrapassada por uma outra. A de que não há alternativa à austeridade, apresentada como um castigo justo, face a hábitos de consumo exagerados. Colossais fraudes. Nem os portugueses merecem castigo, nem a austeridade é inevitável.

Quem viveu muito acima das suas possibilidades nas últimas décadas foi a classe política e os muitos que se alimentaram da enorme manjedoura que é o orçamento do estado. A administração central e local enxameou-se de milhares de "boys", criaram-se institutos inúteis, fundações fraudulentas e empresas municipais fantasma.

A este regabofe juntou-se uma epidemia fatal que é a corrupção. Os exemplos sucederam-se. A Expo 98 transformou uma zona degradada numa nova cidade, gerou mais-valias urbanísticas milionárias, mas no final deu prejuízo. Foi ainda o Euro 2004, e a compra dos submarinos, com pagamento de luvas e corrupção provada, mas só na Alemanha. E foram as vigarices de Isaltino Morais, que nunca mais é preso. A que se juntam os casos de Duarte Lima, do BPN e do BPP, as parcerias público-privadas e mais um rol interminável de crimes que depauperaram o erário público. Todos estes negócios e privilégios concedidos a um polvo que, com os seus tentáculos, se alimenta do dinheiro do povo têm responsáveis conhecidos. E têm como consequência os sacrifícios por que hoje passamos.

Enquanto isto, os portugueses têm vivido muito abaixo do nível médio do europeu, não acima das suas possibilidades. Não devemos pois, enquanto povo, ter remorsos pelo estado das contas públicas. Devemos antes sentir raiva e exigir a eliminação dos privilégios que nos arruínam. Há que renegociar as parcerias público--privadas, rever os juros da dívida pública, extinguir organismos... Restaure-se um mínimo de seriedade e poupar-se-ão milhões. Sem penalizar os cidadãos.

Não é, assim, culpando e castigando o povo pelos erros da sua classe política que se resolve a crise. Resolve-se combatendo as suas causas, o regabofe e a corrupção. Esta sim, é a única alternativa séria à austeridade a que nos querem condenar e ao assalto fiscal que se anuncia.

Paulo Morais, Professor universitário

Indignadamente falando

Lobo Antunes


Façam o favor de ler.
 “ Agora sol na rua a fim de me melhorar a disposição, me reconciliar com a vida.

Passa uma senhora de saco de compras: não estamos assim tão mal, ainda
compramos coisas, que injusto tanta queixa, tanto lamento.

Isto é internacional, meu caro, internacional e nós, estúpidos
culpamos logo os governos.

Quem nos dá este solzinho, quem é? E de graça. Eles a trabalharem para
nós, a trabalharem, a trabalharem e a gente, mal agradecidos,
protestamos.
Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estóico
silêncio. Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias
Loureiro, o senhor Jorge Coelho, coitados. Não há um único que não
esteja na franja da miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos,
que, não sendo ministros, deram o litro pelo País e só por orgulho não
estendem a mão à caridade.

O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto
da bondade as vezes é hereditário, dúzias deles.

Tenham o sentido da realidade, portugueses, sejam gratos, sejam
honestos, reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns
sacrificados, uns Cristos, que pecado feio, a ingratidão.

O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O
senhor Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por
pura maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda
piores do que o nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a
meter os beneméritos em tribunal.
Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de respeito.

Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá
decerto, com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o
estou a ver:
- Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro
- Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima
- Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo

que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa
interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos,
gestores que o céu lhes dê saúde e boa sorte e
demais penitentes de coração puro, espíritos de eleição, seguidores
escrupulosos do Evangelho. E com a bandeirinha nacional na lapela, os
patriotas, e com a arraia miúda no coração. E melhoram-nos
obrigando-nos a sacrifícios purificadores, aproximando-nos dos
banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.
As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem,
penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de
enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas,
ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas
passaremos semdificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam,
por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste
acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à
sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos.
Vale e Azevedo para os Jerónimos, já!
Loureiro para o Panteão já!
Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já!
Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão
feia. Para a Batalha.
Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de
pacotilha com que os livros de História nos enganaram.
Que o Dia de Camões passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja
sentido das proporções, haja espírito de medida, haja respeito.
Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha
de perseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no. Esta pouca
vergonha contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão
presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor
Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis.

Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no
Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.

Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás,
era um pateta. Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do
Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos
Sindicatos. Acabem com as manifestações, as greves, os protestos, por
favor deixem de pecar.

Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E
tereis mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este
solzinho.

Agradeçam a Linha Branca.

Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar.

Abaixo o Bem-Estar.
Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a
aumentar o peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar
aquelas generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a
alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não
comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lomboe transformar as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval.
Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha,
e vocês cartazes, cortejos, berros. Proíbam-se os lamentos injustos.

Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e,
enquanto vender o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade,
a Academia Francesa.
Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os
ex-ministros a tomarem conta disto.
Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar?

O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem,
não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que
ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma
que os processos importantes em tribunal a indignação há-de,
fatalmente, de prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de
litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas seremos,
como é nossa obrigação, felizes. “
 
(crónica satírica de António Lobo Antunes, in Visão)


CRISE É UMA COISA QUE NOS ACONTECE OU QUE AJUDAMOS A CONSTRUIR?
Nota: o titulo deste artigo é da responsabilidade da União de Reformados de Tortosendo