Fio-de-prumo
Paulo Morais |
A ideia de que os portugueses são
responsáveis pela crise, porque andaram a viver acima das suas possibilidades,
é um enorme embuste. Esta mentira só é ultrapassada por uma outra. A de que não
há alternativa à austeridade, apresentada como um castigo justo, face a hábitos
de consumo exagerados. Colossais fraudes. Nem os portugueses merecem castigo,
nem a austeridade é inevitável.
Quem
viveu muito acima das suas possibilidades nas últimas décadas foi a classe
política e os muitos que se alimentaram da enorme manjedoura que é o orçamento
do estado. A administração central e local enxameou-se de milhares de
"boys", criaram-se institutos inúteis, fundações fraudulentas e
empresas municipais fantasma.
A este
regabofe juntou-se uma epidemia fatal que é a corrupção. Os exemplos
sucederam-se. A Expo 98 transformou uma zona degradada numa nova cidade, gerou
mais-valias urbanísticas milionárias, mas no final deu prejuízo. Foi ainda o
Euro 2004, e a compra dos submarinos, com pagamento de luvas e corrupção
provada, mas só na Alemanha. E foram as vigarices de Isaltino Morais, que nunca
mais é preso. A que se juntam os casos de Duarte Lima, do BPN e do BPP, as
parcerias público-privadas e mais um rol interminável de crimes que
depauperaram o erário público. Todos estes negócios e privilégios concedidos a
um polvo que, com os seus tentáculos, se alimenta do dinheiro do povo têm
responsáveis conhecidos. E têm como consequência os sacrifícios por que hoje
passamos.
Enquanto
isto, os portugueses têm vivido muito abaixo do nível médio do europeu, não
acima das suas possibilidades. Não devemos pois, enquanto povo, ter remorsos
pelo estado das contas públicas. Devemos antes sentir raiva e exigir a
eliminação dos privilégios que nos arruínam. Há que renegociar as parcerias
público--privadas, rever os juros da dívida pública, extinguir organismos...
Restaure-se um mínimo de seriedade e poupar-se-ão milhões. Sem penalizar os
cidadãos.
Não é,
assim, culpando e castigando o povo pelos erros da sua classe política que se
resolve a crise. Resolve-se combatendo as suas causas, o regabofe e a
corrupção. Esta sim, é a única alternativa séria à austeridade a que nos querem
condenar e ao assalto fiscal que se anuncia.
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